Itapecuruenses notáveis ( PROFESSORA MARIANA LUZ)

PROFESSORA  MARIANA LUZ
Não vou aqui traçar nenhum perfil filosófico, crítico literário ou científico da professora Mariana Luz, sim, anotar informações, muitas vezes até folclóricas, de pessoas que a conheceram,  avaliar o que encontrei nos seus escritos, e principalmente resgatar o quanto de humana e generosa existia na figura da poetisa, que,  mesmo não a tendo conhecido, sempre tive o maior respeito pela sua pessoa, que ajudou o meu pai, a escrever as primeiras palavras.
            Foi uma das figuras mais expressivas na literatura itapecuruense, com uma produção literária de primeira grandeza. O diferencial de Mariana Luz para outros grandes expoentes da nossa terra, é o fato da poetisa sempre ter vivido em Itapecuru, auxiliando na educação de várias  gerações de conterrâneos, tendo produzido toda sua obra literária na sua cidade natal, muitas vezes falando do cotidiano das pessoas amigas, vizinhos, alunos, autoridades, figuras ilustres, da exponenciais da cultura...  
        Professora Mariana Luz, filha de João Francisco da Luz, comerciante  português e Fortunata da Luz, afrodescendente. Era chamada carinhosamente de “Dona Sianica” (Sinhá Nica)   nasceu no dia 10 de dezembro de 1870, em  Itapecuru-Mirim, faleceu em 14 de setembro de  1960. Foi Educadora, Poeta, Teatróloga, Oradora e Escritora
         Teve uma infância muito simples, sem recursos financeiros para subsidiar os estudos, porém trazia o gosto pelo saber intrínseco no seu cerne. Ao longo da sua vida buscava com avidez o conhecimento, com curiosidade, em tudo que estivesse ao seu alcance. Autodidata, abraçou o magistério muito cedo, “desde onze anos já ensinava” gostava de lembrar a professora.
          Do seu compulsivo hábito de leitura, foi um passo para a poesia. Mariana Luz escreveu sobre vários temas, poesia, peças teatrais, monólogos, porém suas obras tiveram grandes influencia na espiritualidade, por ser católica praticante, sendo da Irmandade “Filhas de Maria” muito atuante na igreja.
        A obra de Mariana Luz, ficou muito tempo na obscuridade, por falta de condições financeiras da autora, para sua publicação. Recorreu aos conterrâneos, e até a Adhemar de Barros, então governador de São Paulo, em 1951, ajuda para publicação de seus livros, sem êxito. Na década de 40, com o apoio do  Centro Acadêmico Clodomir Cardoso da Faculdade de Direito do Maranhão em conjunto com Orbis Clube de São Luis, foi publicado o seu livro “Murmúrios” com pequena tiragem. Livro que a celebrizou, com o qual teve seu mérito reconhecido pela Academia Maranhense de Letras como a segunda mulher a ter um assento na Instituição,  eleita como Fundadora da cadeira 32 patrocinada pelo  poeta  Vespasiano Ramos,  em 24 de julho de 1948.
           “Murmúrios é bem uma coletânea de versos de vários períodos da minha existência. Nele está bem clara a história da minha vida literária, se é que eu a tive realmente. E este prêmio,  que os altos valores da intelectualidade maranhense me concederam eu agradeço de todo coração”  “Muito me sensibilizou a minha eleição para o mais ilustre sodalício ateniense”  em entrevista ao Imparcial em 10 de maio de 1949.
            Tomou posse em 10 de maio de 1949 recebida pelo professor e historiador Mário Meireles, quando proferido pelo acadêmico Ribamar Pereira, o seu famoso discurso “Assim, é que vindo para o convívio desta casa, não vos possa prometer o fulgor de   produções   literárias dignas   deste Areópago   e dos   meus Pares”. Na época, recebeu subsídio da Administração Municipal para a viagem, com uma comitiva de  itapecuruenses, entre autoridades, intelectuais e amigos, que  a acompanharam, para testemunhar tão grande honraria. Também foi convidada pelo então governador, Sebastião Archer para ser hóspede oficial do governo, o que foi declinado, com sensibilizado agradecimento. “Prefiro por motivos especiais, hospedagem em casa de parentes diletos, nem por isso deixo de ser grata a bondade cativante do Senhor Governador, que eu sei, um Mecenas moderno acolhendo e amparando os que dedicam as letras e artes”
           Infelizmente veio a falecer  com a frustração de não ter realizado o seu sonho o de ter seus escritos divulgados. Em 1990 o seu  ex aluno, o  ilustre escritor e historiador Benedito Buzar reeditou “Murmúrios” através das oficinas do SIOGE “Ao tomar a decisão de reeditar Murmúrios, fi-lo com o propósito duplo. Primeiro, resgatar Mariana Luz do esquecimento a que estava submetida, e para que novas gerações possam saber que ela, além de ser uma poetisa da melhor qualidade intelectual, contribuiu de modo acentuado    para o aprimoramento da cultura maranhense” confirma Benedito Buzar.
               Apesar de a crítica ter sido sempre voltada para o foco da tristeza, sofrimento e morte,  sendo taxada como a “Poetisa dos Versos Tristes”, ao me aprofundar mais na leitura, do que consegui ainda encontrar, verifiquei   outros  aspectos temáticos de sua obra,   bastante ecléticos, ora versando sobre: Amor,  Mocidade, Crianças, Risos,  Jovens, Amanhecer, Cenas da Vida,  Esperança, ou sobre, Religiosidade,  Morte, Sofrimento, Dor, etc
    - Sofrimento,  solidão e tristeza -  são os temas muito explorados pela autora. “Uma tristeza vaga, indefinida”, “Esta vida falaz e amargurada”.”A angústia, o mal a que ninguém se exime”. Em entrevista a poetisa confirma: “Prefiro  Escola Antiga, porque me parece agradar mais ao coração. Está mais condizente com a minha alma sofredora”

   - Amor impossível – Um amor tão puro, que talvez por falta de condições, preferiu sucumbir.  “As doces ilusões, que tanto amei”... “Morrer!... E vou morrer sem ter vivido”!  “Tu não podes viver sem  meu amparo. Eu não posso viver sem teu carinho”

 “É que em meu peito, precioso e caro.
 Doce tesouro oculto, como o avaro.
 Um nome, um nome que jamais direi”.

    - Religiosidade – A espiritualidade, o catolicismo, e a fé, estavam presentes em toda sua obra, “Minhas culpas, meu Pai, meus pecados, Senhor. Levaram-te sem dó ao Calvário da dor”! “Eu creio em ti, meu Deus, no teu poder infinito”

  - Beleza, natureza; -  retratada através das paisagens, jardins, crepúsculo, flores, por do sol, tarde,  pássaros, folhas, sorrisos...

   - Dor e Morte – temas bastante explorados em seus escritos, com mensagens cheias de reflexões sobre vida, morte, cadáveres  e dor, como exemplo temos: Suprema Dor, Morte de Almira, Morta, Entre o Berço e o Túmulo, Gracinha Junto ao Féretro da Mãe,   Este caixão teu derradeiro leito” “Eu sinto qual cadáver regelado”
   - Escravidão – representada em lindo texto escrito em comemoração ao Jubileu de Prata da libertação dos escravos em 1927, com o título “Salve 13 de Maio”    “...agora irradiam novos horizontes na sacrossanta asa da liberdade”,
  -  Homenagens – Escreveu belíssimas homenagens a conterrâneos ilustres, visitantes e amigos: À Gomes de Sousa, Gonçalves Dias, Luis Bandeira, Coelho Neto, Padre Possidonio, João Rodrigues, Américo César,  Francisco Félix de Sousa e muitos outros.
           A sua poesia era geralmente cheia de mágoa, mas também escreveu contos, dramas  e comédias. Em sua casa montou um Grupo Teatral. Ela atuava como autora e também encenava, participando do elenco. As peças eram bastante procuradas, em uma    época  que não tinha cinema,  constituíam o maior entretenimento na cidade.
          Em entrevista ao jornal Imparcial, ela confirma “escrevi muitas peças teatrais e  8 comédias que são representadas por senhoritas e rapazes de Itapecuru, no teatrinho de lá” Na época o jornalista folheou as seguintes: “Em casa de Procópio” “Por causa do Ouro” “Noivado de Rosa” e “Um Samba no Cocal” .Chegando até nós, uma, ambientada em Itapecuru talvez da década de 20/30  onde ela se identifica com a “Justina” personagem  de rígido padrão moral.
            Doninha ainda criança de peito, com a morte de sua mãe passou a ser criada e amamentada por sua tia Anacleta. Certo tempo depois Anacleta também faleceu e Doninha, novamente órfã passa a ser criada por seu padrinho, Félix Rodrigues, em Itapecuru-Mirim, onde estudou com Mariana Luz. E fez parte do seu grupo teatral, responsável pela encenação de muitas comédias à época”.  Livro Cantanhede Memória,  de João Carlos Cantanhede
           Escreveu também um Livro de Orações e Cantos Litúrgicos
          A educadora Mariana Luz não teve filhos biológicos, o seu filho adotivo Francisco Félix de Sousa, Chiquinho, Enfermeiro do Exército, do Rio de Janeiro,  foi o guardião dos seus escritos até a sua morte quando passou a seu irmão Absai Siqueira Sousa, que sempre dizia; “Os documentos da poetisa Mariana Luz, não me pertencem, pertencem à comunidade itapecuruense” Infelizmente  grande parte do acervo literário da poetisa, foi perdido, todo trabalho de uma vida dedicada a poesia.
            A poetisa mantinha correspondência geralmente feita em sonetos com vários amigos, era muito solicitada para escrever homenagens para aniversariantes que eram lidas na “Voz Paroquial”. “ela escrevia com muita espontaneidade, escreveu duas mensagens para minha mãe, baixava a cabeça e fazia rápido um soneto” disse Lósa Felix
             Com poetisa Laura Rosa, primeira   mulher a   ter assento na Academia Maranhense de Letras, (fundadora da cadeira 26) cognominada “Violeta do Campo” manteve estreita correspondência em verso e prosa: A Uma Amiga, Resposta, Três Flores e outras...
“...Depois de saborear,
Com calma, esses teus cantares,
Eu vi que tinha razão
O teu amigo Tavares”,
         
          Também o poeta Leslie Tavares da “Renascença Literária” grupo dissidente da “Oficina dos Novos”  no  começo do Século XX, amigo em comum com Laura Rosa, manteve troca de correspondência, tentando negar o escopo da sua poesia, voltada à tristeza.  Em  Resposta: “Julgaste descobrir na minha pobre rima / Um sofrimento atroz que me alanceia a alma” e  em Replicando: “Persistes em supor que minha vida”  “ Para mim tudo é belo e sorridente”

          Tomando por base apenas os sonetos de Murmúrios, Clóvis Ramos, afirma, “é uma poetisa  de feição simbolista” Já José de Jesus Moraes Rego, afirma:” Existe um quê, em busca da arte pura, nos seus poemas – aquela poética alicerçada pelo individualismo responsáveis pelos valores eternos da literatura”

          Na administração de Bernardo Tiago de Matos, (1942 a 1945), foi construída pela Prefeitura Municipal, e doada à professora, uma casa à Rua Caiana (atual Av. Brasil)   Fez jus a casa, pela importancia que  exercia a professora, na sociedade itapecuruense, como Patrimônio da nossa cultura. A casa supra citada foi deixada,  por determinação da poetisa, à Nossa Senhora das Dores depois da sua morte. O imóvel foi vendido, pela paróquia,  em 1999 ao Senhor José Ribamar Mubarack  onde é hoje a Farmácia Leticia.
              Somente em 1941, na administração de Felício Cassas, já com mais de 70 anos de idade,  que a educadora Mariana Luz conseguiu uma nomeação pelo município de Itapecuru mirim, com lotação da Escola Getúlio Vargas.
            Depois de antigas reivindicaçoes de Felício Cassas, ao governo, finalmente,  através  do Decreto Lei nº 1517 de 23 de junho de 1947  tendo como governador Sebastião Archer,  passa a ter direito a um subsídio estatal mensal,  por merecimento, pelo muito que contribuiu para cultura  do nosso povo.
            A poetisa Mariana Luz,  terá finalmente o seu mérito resgatado, sendo Patronesse Geral da Academia Itapecuruense de Ciencias, Letras e Artes.
           Jucey Santana