BERTULINO CAMPOS – O Canário Cantador
Por Jucey Santana
Contrariando
a realidade do nordestino, com alto grau de analfabetismo, a grande
popularização da literatura regional encontrada no meio das danças folclóricas
se dá pelos esforços dos poetas autodidatas, que compõe e interpretam seus
sentimentos para divertir o povo em determinadas regiões em época específicas.
Esses poetas cantadores, em sua
grande maioria de origem humilde, oriundos do campo, das roças migram para os
centros urbanos onde passam a produzir suas toadas, muitas vezes com talentos
hereditários, se tornando grandes líderes naqueles seguimentos, da cultura
popular. Precisamos conhecer melhor, valorizar e respeitar a multiculturalidade
própria de cada região, os significados, experiências, as lendas, o imaginário
do folclore, e assim manter viva na memória, a identidade do nosso povo.
Negro Leo, Buzar,Bertulino e Moaciene |
Bertulino é pouco conhecido no
município, porém no na área da Aviação, Magal Escuro, Vinagre, Lago Encantado,
Nova Aurora e toda aquela a região ele é unanimidade, inclusive entre os
jovens, que se emocionam ao relembrar o
grande mestre. A produção musical de Berto, rica e diversificada própria de sua
personalidade arrojada, girava em torno de:
fatos políticos, lendas, milagres
dos santos, a vida do lavrador, magia, fé, São João, pobreza, terra. Como era
muito galanteador, cantava muito o amor, com uma produção simples como o povo,
sem muitas formalidades, mas com a participação popular e a alegria. A sua música mais popular era “Morena”,
cantada no seu enterro. Vale lembrar que durante o velório, houve várias
manifestações populares, com diversas danças, onde se apresentaram os amigos Silas Gomes, Moaciene Lima, Maria
Sampaio e outros.
MORENA
Morena, este teu corpo me mata, / Este teu
cabelo me maltrata
O meu pobre coração. / Eu vou me embora daqui
Vou me embora daqui / Aqui não posso ficar
Com uma dor no coração / Sem ter onde me tratar.
Natural da vizinha cidade de Carema
(hoje Santa Rita), era filho de José
Meneses e Agostinha Campos, nasceu em 24 de agosto de 1915. Seu pai veio de Carema no final dos anos 20 do
século passado estabelecendo residência no povoado Nova Aurora, ficando o jovem
Bertulino em Santa Rita, casando-se aos
16 anos com a senhora Adriana Muniz Campos com quem teve 12 filhos. O seu pai
Ze Menezes tinha uma promessa de botar boi todo ano,e o Berto mesmo morando em Santa Rita, vinha
brincar os folguedos e ajudar o pai na montagem do evento. Depois que nasceram
seus dois primeiros filhos por volta do ano de 1935 mudou-se de vez para o
povoado Nova Aurora, passando a trabalhar
com o pai, na organização dos Bois, que era a grande paixão da família. Alguns
bois de Zé Menezes: “Flor do Amor” “Beija Flor”
e “Brilho da Terra”
Nos anos 40 o Berto já botava seu próprio boi,
sendo o primeiro “B Dourado”, depois veio “Diamante” “Alegria do Povo” “Linda Amante” e muitos outros, mas era conhecido mesmo, como
“Boi do Bertulino” ou “Boi da Aviação”
Segundo Zé do Mariano (José Bezerra) com 75
anos “comecei dançar com Berto em 1950, desde os treze anos e nunca mais parei
e o Nato da Lavandeira era sempre o miolo do boi”
“O coro do boi era, confeccionado por
bordadeiras de Rosário, e o próprio Berto
fazia a armação, com a ajuda dos brincantes” continua Zé do Mariano.
Ele
era amo, cantador, líder, o primeiro
contra amo foi seu irmão José Menezes, depois Afranísio e outros mais.
A morte dos bois sempre acontecia no
largo onde hoje é a Praça do Viva. Era
um evento carregado de emoção, muitos choravam, entre brincantes e
simpatizantes, tendo muitas estórias de desmaios ocasionadas pelo tom de
tristeza do acontecimento.
“Já morreu, já morreu,
Já
se acabou./ Mataram meu B Dourado,
Grande
paixão me deixou”
“Tem
uma dor no meu peito
Outra
em meu coração / De ver o meu boi amarrado
Na
praça, naquele mourão”.
As primeiras notícias que se tem de
manifestação junina, com bumba boi, em nosso município, de maneira muito acanhada era levada era
feita de porta em porta, relembrando os costumes do Reizado.
A
partir de maio começava a programação, sendo apalavrado antes as casas a se apresentar. Era costume
começar pela casa do Juca Magarefe, depois a casa de Graciete, Miguel Fiquene e
outros.
A
apresentação oficial, quando descobria a “pinta” (descer o pano que cobria o boi) era na porta
de Abdala Buzar, que era o maior incentivador
da brincadeira. Ele criava a música de acordo com a situação. Exemplo:
“ Itapecuru é uma cidade querida / De um
povo hospitaleiro
Que possui
educação / Porisso eu falo confiante
Com toda
clareza. / Do meu coração / O doutor Nonato Cassas
e Abdala Buzar com certeza / São amigos da população”
Exemplo de
desafio, no encontro com outro boi, geralmente de Santa
Rita:
“Eu
botei meu boi na rua / Para o povo ver
Contrário
ficou com medo / Do meu batalhão
Escuta
contrário, o que vou te dizer.
Minha
trincheira está formada / Com armas na mão”
“Ó
lá vai boi, é de Santa Rita
Ele
vai derrubando as coroas dos cantores
Te
arreda contrário / Lá vai seu superior”
Berto mandava
anunciar na Voz Marília, o início das
apresentações.
“
Eu preparei uma mensagem
E
botei no alto falante / Mandando tirar licença
Pra
brincar com Linda Amante”
Bertulino
estava presente em todos os eventos culturais com os seus acessórios
inseparáveis, o boné e o seu cavaquinho.“O
coro do boi era, confeccionado por bordadeiras de Rosário, e o próprio
Berto fazia a armação, com a ajuda dos
brincantes” conta Zé do Mariano.
em que ele era amo, cantador, líder, o primeiro contra amo foi seu irmão José
Menezes, depois Afranísio e outros mais.
A morte dos bois sempre acontecia no
largo onde hoje é a praça do Viva. Era
um evento carregado de emoção, muitos choravam, entre brincantes e
simpatizantes, tendo muitas estórias de desmaios ocasionado pelo tom de
tristeza do acontecimento.
Outra
companheira do Berto, que esteve ao seu
lado por muitos anos, chama-se Raimunda Cabral: Mundica, não chegando a ter
filhos com esta. A terceira esposa, a
Senhora Lina Campos, já tinha duas filhas já tinha duas filhas que foram
adotadas por ele. As suas esposas sempre apoiaram e auxiliaram a sua arte, que
segundo sua filha Eulália Campos da Silva - Lazinha, a casa vivia sempre cheia
de brincantes e simpatizantes dos folguedos, e as esposa acolhia a todos com
carinho.
Depois de uma malsucedida cirurgia de catarata,
ficou sem enxergar, mas continuava a compor, e pedia que anotassem a letra.
“Ele nunca sentiu tristeza na vida, e mesmo cego carregavam ele pra todo lado,
onde tinha festa ele estava cantando” disse Silvia Campos sua neta.
Ele era muito crítico de ouvido,
quando escutava música na televisão, dizia: “Esse não sabe fazer música, não
rimou”
Já na velhice, passou a viver com o filho João
da Cruz Muniz Campos e a neta Silvia de Sousa Campos, que cuidaram dele até sua
morte em 23 de abril de 2012. Mesmo cego e quase surdo as pessoas
continuavam levar o mestre para os
folguedo, para que puxasse os suas toadas criativas Berto, como devoto de São Benedito da Casa de
Forno, mantinha a promessa de bater tambor todo ano no dia do seu aniversário,
em homenagem ao Santo, tornando-se tradição no bairro da Aviação, todo mês de
agosto.
Em 15 de maio de 1986 um grupo liderado
por Bertulino, Bandeira, Adelino, José Santana e Manelino, foi criado o Boi da
Cultura. Mais tarde em 13 de maio de 1995 nasceu o Boi Apaixonado tendo
Moaciene Monteiro Lima como presidente fundador e Berto co-fundador.
Pela contribuição que deu a nossa
cultura, foi agraciado com o título de cidadão itapecuruense outorgado pela
Câmara Municipal, no dia 07 de novembro de 1997.
“O melhor dançador de Boi da cidade, ele
botava boi todo ano e dançava tudo enquanto...
Hoje
tem muito cantador mais não chega nem aos pés dele” diz emocionado seu amigo e
também dançador Martins Sousa, morador da Aviação.
Faleceu aos 97 anos deixando muitos
netos, bisnetos e trinetos, deixando órfão muitos aprendizes, que eram seus
seguidores. Perdendo muito a nossa cultura.
BERTULINO CAMPOS
Autora: Maria
Sampaio – Membro da AICLA
Eu mandei
anunciar / Meu vaqueiro é hora é hora
Eu tenho o
canário preso / Quando ele canta todo mundo chora
Quando eu fiz
esta toada / Pensando no meu destino
Oferecendo ao
cantador que / Chama-se Bertulino
Bertulino é o
canário / Eita canário cantador
Nesta Itapecuru
já demonstrou / O seu grande valor
Juventude vai
pra frente / Que chegou a nossa vez
Vamos então
valorizar / Fazer o
que Bertulino fez
Quando Bertulino
cantava / Fez muita gente chorar
O canário que
esta preso agora / Vai se soltar